sábado, 27 de julho de 2019

Porcos e Cachorros



Descobri um novo tipo de chato, ou melhor, de chata. É aquela que pensa que adivinhou seus pensamentos. Olha pra você com uma cara de: "Eu sei o que está querendo, seu porco...."
Por mais que você tente desviar os olhos, pensar em rumbas e guarânias, lá está ela te acusando: "Não disse que eu sabia? Tá fugindo, mas eu sei direitinho quem é você, seu canalha!"
Joga uma tonelada de culpa nas suas costas, com um só olhar incriminador.
Você acha aquilo esquisito. Em questão de segundos, revisita os últimos dias, os últimos meses, os últimos anos. Não há nada, absolutamente nada a temer. Certo de sua total inocência, você tenta atribuir aquela atitude a um engano, um equívoco, quem sabe, a uma fofoca, algo que disseram que você fez ou disse sobre a tal figura, que você nem lembra o nome. Como é um sujeito normal, você resolve não dar importância ao acontecido. Continua por ali, comendo uns canapés, molhando o bico no vinho branco, enfim, fazendo essas coisas que transformam uma festa de casamento em...
De repente, alguém te cutuca pelas costas, você se vira e... É ela! Pensa em perguntar alguma coisa, chega a sorrir pra ver se ela retribui, mas tudo o que recebe em troca é o silêncio, um iceberg de desprezo, a cabeça balançando, como quem lamenta: "Quem diria... A que ponto chegou o terror de Vila Matilde". Você já nem se lembrava mais de ter sido algum dia "o terror de Vila Matilde", mas certamente era isso que ela queria dizer com aquele olhar de Maria Antonieta depois da guilhotina.
A coisa tá feia pro seu lado. Em pouco tempo, você começa a notar que as pessoas se afastam quando você se aproxima. Alguns, até então seus amigos, inventam uma desculpa e saem de fininho; outros chegam a bater nas suas costas, como quem diz: "Coragem, coragem..."
Até os garçons começam a te evitar. Os canapés passam longe,  as taças de vinho já não são para o teu bico.
Na hora que você vai cumprimentar a noiva, o pai da moça toma a sua frente e fica te encarando, provavelmente lendo seus pensamentos sujos, suas torpes intenções.
Você acha que aquilo é um pesadelo e que logo estará a salvo. Ledo engano... Na saída da festa, sua mulher agarra o seu braço e diz, mastigando amargas palavras: "Laurinha me contou tudo, não adianta negar. Em casa vamos ter uma conversinha, seu cachorro..."

sábado, 2 de março de 2019

From Twitter @atebrreve

Da novíssima série "É triste, mas é verdade": O amor quando morre e não é enterrado, não demora muito, vai feder". 

domingo, 6 de janeiro de 2019

FRITO, COZIDO OU CRU (sem perninhas)?

Fn
Uma jovem, de seus vinte e poucos anos, me disse que encontrou um bichinho estrebuchando na sala de casa e que isso devia-se ao uso daqueles aparelhos elétricos, que atuam como repelentes de insetos. Eu não estava muito a fim de acusar, muito menos defender, baratas e mosquitos, mas também não queria deixar com a menina a última palavra sobre a nossa proverbial crueldade humana. Preferi uma explicação fantasiosa, disse que os insetos arriscavam-se demais ao se aproximar dos humanos, nem desconfiavam que seriam eles, os insetos, a principal fonte de proteína nessa derradeira etapa da nossa “evolução”. 
Surpresa, ela fez uma cara de nojo e jurou que nunca na vida ia comer um gafanhoto, nem um daqueles fritinhos nas feiras da Coreia ou da China. Já não estava defendendo as espécies que nós esmagamos, cada vez mais com o auxílio da tecnologia, agora o horror era a algo que podemos resumir em uma única frase: “A que ponto chegamos… ou chegaremos”.
Me deu vontade de explicar que foi por isso que resolvi parar de escrever, a certeza de que  caminhamos para o fim dos tempos e, portanto, nada, nada mesmo é imortal, além da luta pela sobrevivência. “Quanta pretensão...”, ouvi alguém dizer indignado. Escaneei a sala pra ver de onde partira o comentário. Ninguém, nem a jovem que saíra para uma reunião da ONG “Defenda Seu Bicho”, o único ser vivo na sala era uma risonha e temerária borboleta.